As dimensões da Globalização

O fenómeno da Globalização e as suas dimensões, económicas, sociais, politicas, ideológicas e culturais, permitem uma visão multifacetada desta matéria, nesse sentido, é preciso sobretudo distinguir dois sentidos diferentes de multi-culturalismo, o primeiro diz respeito ao sentido descritivo, cujo retrata um fato da vida humana e social, expressando a cultura étnica, religiosa encerrada no tecido social, traduzindo-se no cosmopolitismo, em segundo o sentido prescritivo, que alude às politicas de reconhecimento de identidade e de cidadania diferenciada, que os poderes públicos devem praticar a favor dos grupos minoritários.
Do ponto de vista
conceptual o autor Boaventura Santos, (2001), retrata o multi-culturalismo
emancipatório como um projeto de regras democráticas de reconhecimento mútuo de
identidades culturais; trans-identidades; inter-identidades, identidades
hibridas e duais. Resumindo, a contra-hegemónica da globalização indica
práticas sociais, baseadas na matriz trans-identitária e transcultural.
Objetivamente, e no sentido de melhor compreender esta temática, é necessário relembrar alguns conceitos como Identidade, Movimento Social, Cidadania e Nacionalidade. Grosso modo, segundo Castells (2003), a construção social da identidade adota três diferentes formatos, a Identidade legitimadora, que é introduzida pelas predominantes instituições da sociedade, cujo objetivo é expandir, racionalizar e naturalizar o poder sobre os diferentes atores sociais. A Identidade de resistência, é o tipo mais comum nas sociedades contemporâneas, onde os atores sociais se encontram em posições desvalorizadas, criando assim formas de resistência, assentes em princípios diferentes daqueles que norteiam a sociedade. Por último, a Identidade de projeto que é um segmento da anterior, que pretende a transformação da sociedade visando a conceção de uma vida diferente.
Desse modo durante o procedimento os atores sociais criam uma nova identidade, redefinindo a sua posição na sociedade, ao mesmo tempo que se altera a estrutura social, exemplo disso, foi o movimento feminista aludido na doutrina de Castells.
Segundo A. Touraine, M. Castells (2003), os movimentos sociais, podem explicar-se a partir do princípio da identidade do movimento social, ou seja, o que é e quem representa; do adversário, identificando o inimigo alvo do movimento que se insurge; do objetivo, o qual é promovido coletivamente visando a nova ordem social. Segundo L.Vieira (2001), no que concerne à Cidadania e Nacionalidade existe essencialmente duas noções diferenciadas, a primeira, a noção clássica que foi ultrapassada, defendendo uma nova ideia que privilegia os direitos sociais e económicos em detrimento dos políticos, a segunda a cidadania pós-nacional, baseada nos direitos humanos, não se verificando laços identitários com o Estado-Nação. Os Movimentos Sociais nas últimas décadas têm assumido um papel fundamental na construção da democracia participativa, espelhado no desenvolvimento politico e na emancipação social. Uma contenda onde o enfoque reside no paradigma do fenómeno da globalização; uma vez que, está a transformar o planeta num sítio melhor, em termos de capacidade produtiva, na criatividade cultural e potencial de comunicação, todavia está a privar as sociedades de privilégios e direitos políticos. É nesta dicotomia gerada pelo fenómeno da globalização, que o poder hegemónico é confrontado por poderes contra hegemónicos, que se traduz na luta de movimentos socais, cujas características tem vindo a evoluir, assumindo atualmente uma dimensão global, baseada em sugestões de localização e de territorialização, redescobrindo o sentido de localidade e de comunidade.
Em sentido macro, os movimentos sociais são heterogéneos, com centros de atuação diferenciados, visam sistematicamente reivindicações ao Estado e às suas práticas capitalistas, uma vez que, é ao Estado que compete aprovisionar a sociedade das necessidades materiais básicas. Compostos por grupos de cidadãos que lutam pela justiça e por uma política económica e social equitativa, apresentam-se como alternativas de rompimento com a ordem hegemónica reinante, de forma a diminuir desigualdades entre os povos. Como exemplo de movimentos sociais emergentes da luta contra-hegemónica no campo das práticas capitalistas; indico o Movimento Social Operário, (originário do movimento operário da década de 70). Este nasce sobretudo do mercado global contemporâneo, deixando de ser maioritariamente operário, incluindo o setor terciário, estabelecendo-se pela via institucional de concertação social. Embora este movimento em Portugal, na luta contra o capitalismo, seja revisto nos sindicatos da CGTP e UGT, este ainda não se assumiu como dinamizador da sociedade civil, na construção de uma cidadania efetiva. Grosso modo, em um mundo de crescente mutação, assiste-se ao aumento de um apelo à criação de novos ativismos transnacionais, representados em movimentos globais sociais sindicais, pois não só está em causa os direitos laborais, como a defesa dos direitos sociais. Um movimento claro de oposição às práticas capitalistas é o Movimento Social dos Sem Terra, que persegue a reforma agrária do Séc. XXI; é organizado tanto por trabalhadores como por sem terra, que lutam através da ocupação coletiva de prédios urbanos e feudos, que não cumprem a função social para a qual foram concebidos. De fato os movimentos sociais são cada vez mais visíveis na luta contra o caracter global capitalista das sociedades, visando comunidades mais humanas e sociais.
Outro segmento de Movimento Social é o de cariz Ecológico, onde os ambientalistas assumem uma luta de relevo contra as práticas capitalistas, que visam o lucro imediato, muitas vezes prejudicando a preservação e sustentabilidade do meio ambiente. Saliente-se que esta luta tem sido difícil, por causa dos lóbis capitalistas instalados, refletida na difícil ratificação e concretização da agenda do Protocolo de Quioto. Esta luta em defesa do meio ambiente tem exigido ao poder hegemónico, medidas de proteção ambiental, nomeadamente, proteção da fauna, da floresta e de preservação de espécies em via de extinção. Importa clarificar que nesta multiplicidade de movimentos, nem todos se centram, na luta direta contra-hegemónica na área capitalista. Muitos surgem da necessidade de interesses locais, sendo direcionados, como é o caso da tentativa de bloqueio de construção de barragens, designadamente, na Amazónia, devido à extração de madeiras… Dessa forma, movimentos que apesar de não serem emergentes, permanecem contemporâneos pelo seu reconhecimento global; por exemplo, a Greenpeace e a Quercus, entre outros…
Como exemplo Português de um Movimento Social de Cariz Global, temos o Movimento dos Indignados, fenómeno impulsionado pela plataforma Facebook; que desprendido de qualquer corrente partidária e à margem das associações sindicais, surge num contexto de descontentamento generalizado da população, devido à incapacidade dos Estados Nacionais resolverem questões como o desemprego e a falência do Estado. É um Movimento contra a ordem instituída, tendo como iniciadores os jovens da sociedade, evocando a transformação mental dos indivíduos, exortando a participação de todos, propondo o rompimento da subordinação às regras capitalistas.
Nos últimos tempos, tem-se assistido ao crescimento de movimentos sociais globais, de tendências anarquias, que na minha opinião fogem à essência da luta das anteriores. Estas podem ter consequências colossais para as sociedades, como é o caso do surgimento de grupos de extrema-direita com ideologia Neonazi. Estes na contestação dão primazia à agressão pela força física, onde o seu principal objetivo é a instalação do caos e desordem ao regime de poder vigente. Ainda nesta linha de pensamento, note-se os movimentos sociais de cariz religioso, que na luta pela sua sobrevivência, apresentando-se como alternativas de salvação, liberdade e felicidade, adotando o terrorismo em nome de Deus. A Al-Qaeda é um bom exemplo disso mesmo, lutam contra o sistema capitalista ocidental, impondo o terror, baseados no fundamentalismo islâmico, proclamando valores do Corão.
Em termos de consenso global, ainda no campo da luta dos movimentos de cariz social coletivo, um especial destaque para a agenda de trabalhos do Fundo Social Mundial, na reivindicação de melhores condições de vida para os povos e respetivo reconhecimento das minorias.
Em suma, no mundo cada
vez mais global, os movimentos sociais, são de extrema importância para o
exercício de uma participação democrática ativa, na manutenção do equilíbrio e
atenuação das desigualdades, entre o triângulo poder vigente, cidadãos e
interesses instalados. Como o autor Boaventura Santos bem refere “Temos o
direito a ser iguais quando a diferença nos inferioriza e de ser diferentes
quando a igualdade nos descaracteriza” (p.80).
Bibliografia:
- Sousa Santos, B. Globalização.
Fatalidade ou Utopia? 3ª Edição- 2005, Porto: Edições Afrontamento; e Castells,
M. (2003), O Poder da Identidade, 2ª Edição- 2007, Lisboa: Fundação Calouste
Gulbenkian.
João Carriço
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